No dia 24 de maio de 2022, a Justiça do Trabalho suspendeu, a mando da vice-presidente do Tribunal Superior do Trabalho, a ministra Dora Maria da Costa, todos os processos que discutem em fase de execução, a inclusão de sócio ou empresa supostamente pertencente ao mesmo grupo econômico da empresa principal.
A decisão se deu no processo AIRR 10023-24.2015.5.03.0146, em que a empresa alvo da reclamação trabalhista apresentou recurso ao TST, alegando não ser possível sua responsabilização pela dívida assumida pela devedora principal sem a prévia instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica.
Alegou também que não há amparo na previsão legal do artigo 2°, § 2°, da CLT para reconhecimento de grupo econômico pela mera identidade dos sócios, e, por fim, que mesmo que admitida a configuração do grupo econômico, não poderia ser incluída no polo passivo da execução eis que não atuou como parte da relação processual na fase de conhecimento.
Os processos continuarão suspensos até parecer do STF sobre o assunto, eis que o entendimento ainda não é pacificado entre as Turmas do Supremo.
Sabe-se que o conceito de grupo econômico está presente no artigo 2°, § 2°, da CLT, que dispõe que “sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico, serão responsáveis solidariamente pelas obrigações decorrentes da relação de emprego.”
Para que seja declarada a existência ou inexistência do grupo econômico, é necessário que haja a discussão do mérito, que ocorre durante a chamada “fase de conhecimento”, sendo este o momento processual para o exercício do contraditório e da ampla defesa, princípio previsto no artigo 5°, LV, da Constituição[1], um dos mais importantes princípios que norteiam o ordenamento jurídico brasileiro.
A fase de conhecimento termina quando da decisão transitada em julgado, ou quando não há recurso com efeito suspensivo sobre a decisão, dando início à fase de execução.
Durante a execução não há mais discussão de mérito, como pontua o artigo 879, § 1°, da CLT, tratando-se do momento de imposição do cumprimento daquilo que foi determinado pela Justiça, depois de ampla análise dos fatos e fundamentos expostos na fase de conhecimento.
Portanto, a inclusão de um sócio ou empresa no polo passivo de uma reclamação trabalhista, durante a fase de execução, independente do motivo alegado, seria um impeditivo ao exercício do contraditório e da ampla defesa, diante da impossibilidade de discussão de mérito, o que desrespeita o princípio do devido processo legal.
Nesta esteira, em 2021, o Ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, se manifestou sobre o assunto, em despacho publicado no dia 14/09/2021, no processo STF RE 1.160.361-SP, argumentando que, desde o cancelamento da Súmula 205[2] do TST, houve uma insegurança jurídica na perspectiva do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.
Alegou que o entendimento pela inclusão da empresa no polo passivo para composição de grupo econômico na fase de execução, não teria observado o advento do Código de Processo Civil de 2015, que prevê a impossibilidade de cumprimento de sentença em face de quem não tiver participado da fase de conhecimento, senão vejamos:
“Art. 513. O cumprimento da sentença será feito segundo as regras deste Título, observando-se, no que couber e conforme a natureza da obrigação, o disposto no Livro II da Parte Especial deste Código.
§ 5º O cumprimento da sentença não poderá ser promovido em face do fiador, do coobrigado ou do corresponsável que não tiver participado da fase de conhecimento.”
A aplicação da norma supramencionada estaria em conformidade com os ditames legais eis que, de acordo com o artigo 15, do Código de Processo Civil, quando há ausência de normas que regulem o processo trabalhista, serão aplicadas as normas do CPC.
Conclui-se que, mesmo sendo um entendimento ainda não pacificado no STF, a inclusão de uma empresa no polo passivo de uma reclamação trabalhista, em fase de execução, sem que esta sequer tenha atuado no polo passivo da relação processual durante a fase de conhecimento, é uma evidente afronta ao princípio constitucional do contraditório e da ampla defesa, bem como do devido processo legal, eis que obriga a empresa ao pagamento de uma dívida já assumida pela devedora principal.
Ana Julia Morgado, graduanda em Direito na Universidade Presbiteriana Mackenzie, cursando o 7° semestre.
[1] “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[…]
LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”
[2] “Súmula nº 205 do TST
GRUPO ECONÔMICO. EXECUÇÃO. SOLIDARIEDADE (cancelada) – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003
O responsável solidário, integrante do grupo econômico, que não participou da relação processual como reclamado e que, portanto, não consta no título executivo judicial como devedor, não pode ser sujeito passivo na execução.”