Mais pedidos de recuperação judicial: o céu é o limite?

Você sabia que 2024 já se tornou o ano com maior número de pedidos de recuperação judicial dos últimos 20 anos?

O mundo passa por um momento em que nenhuma empresa está imune às crises, seja por desafios externos, como a instabilidade da economia nacional, ou os internos, ligados à gestão financeira. Segundo o Indicador de Falências e Recuperação Judicial da Serasa Experian, as micro e pequenas empresas lideraram as requisições e o setor de Serviços é o campeão de solicitações. Vale destacar que esses dados são somente de outubro de 2024.

Ao analisarmos detalhadamente os motivos encontramos questões como a alta da taxa básica de juros (Selic), que foi elevada a 11,25% ao ano em outubro de 2024, consequentemente a alta dos juros elevou o custo do crédito e dificultou o pagamento de dívidas pelas empresas. Além disso, contamos também com a inadimplência dos consumidores que impactou negativamente o fluxo de caixa das companhias, reduzindo o poder de compra e as vendas.

Para uma empresa funcionar adequadamente, ela depende de uma cadeia produtiva bem estruturada. Isso envolve desde a compra de matéria-prima a preços justos até o acesso ao crédito para manter o fluxo de caixa e oferecer produtos ou serviços de qualidade a preços competitivos. Para que esse ciclo se mantenha, é fundamental que as empresas tenham uma certa previsibilidade do mercado, algo que tem sido difícil de alcançar nos últimos anos.

Podemos afirmar que desde a pandemia do COVID-19, o Brasil tem enfrentado um cenário de instabilidade econômica. Grandes empresas recorreram à recuperação judicial, gerando um efeito dominó que atingiu principalmente os pequenos negócios, com estruturas mais enxutas e menos capacidade de resistir a choques econômicos. Além disso, a alta das taxas de juros, atualmente em 10,5%, aumentou o custo do crédito e dificultou ainda mais a quitação de dívidas.

Em tempos de dificuldade financeira, as empresas se veem obrigadas a se reestruturar de uma maneira nada saudável. Para cortarem custos, acabam demitindo uma grande quantidade de colaboradores, consequentemente aumentando o desemprego e por fim reduzindo o poder de compra da população. É um ciclo e como consequência final a demanda diminui afetando ainda mais o fluxo de caixa das empresas e agravando a situação financeira.

Com a alteração da Lei nº 11.101/05 e a introdução do “fresh start”, tivemos maiores possibilidades de reabilitação mais rápidas para os empresários falidos ou que seguem por esse caminho. No entanto, ainda existe um grande estigma em torno do pedido de falência, o que faz com que muitas empresas evitem a recuperação judicial ou se dissolvam irregularmente para não precisar passar por esse processo, por isso a informação de queda dos pedidos de falência precisa ser analisadas de forma cautelosa.

Com o “fresh start”, tivemos a redução do prazo para a extinção de obrigações pós-falência de 5 para 3 anos, a extinção das obrigações do falido com o pagamento de mais de 25% dos créditos quirografários, comunicação imediata das Fazendas Públicas para baixa da falida no CNPJ e atenção aos princípios da celeridade e da economia processual.

Vale lembrar que a Recuperação Judicial é um meio utilizado por empresas para evitar a falência. Esse processo permite que as companhias tenham um tempo maior e a possibilidade de renegociarem as dívidas acumuladas, consequentemente evitando demissões, falta de pagamentos e até mesmo encerramento da empresa.

Ao terem o plano aprovado, grande parte das dívidas da empresa são suspensas, consequentemente o pagamento aos credores é postergado ou interrompido temporariamente. Dessa forma a empresa pode priorizar despesas como salários dos funcionários, tributos e aquisição de matéria-prima indispensáveis para a continuidade das operações.

Diante de um cenário econômico desafiador, com milhares de CNPJs enfrentando dificuldades financeiras este ano, a recuperação judicial tem se mostrado uma alternativa crucial para muitas empresas continuarem operando. Contudo, é imprescindível que as empresas busquem alternativas para se adaptar a esse novo contexto.

Nathália Borelli é advogada especialista em recuperação judicial e falências do escritório Yuri Gallinari Advogados.