O maior impacto para todo Devedor quando ingressa com o seu pedido de a Recuperação Judicial é a boa negociação do seu Plano de Recuperação Judicial com os seus credores, isso porque, a consequência prática da não aprovação é uma só: a falência.
O quórum para aprovação do Plano, pelo artigo 45 da Lei nº 11.101/2005 se dá seguinte forma: classes II (credores com garantia real) e III (credores quirografários) deverão aprovar a proposta por credores que representem mais da metade do valor total dos créditos e cumulativamente pela maioria simples em relação aos credores presentes; já e nas classes I (credores trabalhistas) e IV (credores ME e EPP), a proposta deverá ser aprovada pela maioria simples dos credores presentes.
Como toda regra tem a sua exceção, a Lei também prevê a possibilidade de aprovar o Plano por “cram down” (art. 58, §1º), sendo que o juiz poderá conceder a Recuperação Judicial com base em plano que não obteve a aprovação na forma acima mencionada, devendo ser preenchido cumulativamente os requisitos:
I – o voto favorável de credores que representem mais da metade do valor de todos os créditos presentes à assembleia, independentemente de classes;
II – a aprovação de 3 (três) das classes de credores ou, caso haja somente 3 (três) classes com credores votantes, a aprovação de pelo menos 2 (duas) das classes ou, caso haja somente 2 (duas) classes com credores votantes, a aprovação de pelo menos 1 (uma) delas, sempre nos termos do art. 45 desta Lei;
III – na classe que o houver rejeitado, o voto favorável de mais de 1/3 (um terço) dos credores, computados na forma dos §§ 1º e 2º do art. 45 desta Lei.
Ocorre que recentemente, o Superior Tribunal de Justiça (“STJ”), ao julgar o Agravo em Recurso Especial nº 1.551.410, se deparou com a seguinte situação: determinada instituição financeira, que costumeiramente tem a posição de rejeitar o plano, fato que é de conhecimento de todos os agentes atuantes na área, seguiu com seu posicionamento e foi o único credor a rejeitar o Plano apresentado à assembleia de credores. Sendo que, no caso, o credor é detentor de 56,8% dos créditos da classe de credores quirografários (sendo que no caso em referência, para aprovação do cram down, era extremamente necessária anuência do seu voto, vide inciso III do mencionado art. 58, §1º).
Assim, em julgamento apertado, o STJ entendeu pela ampliação da possibilidade sobre o entendimento de aprovação por cram down: não se pode deixar ao livre arbítrio de uma minoria o destino da empresa em recuperação judicial. Justamente nestes casos o cram down pode e deve ser aplicado, notadamente se constatado que a maioria dos demais credores de outras classes concordam com a aprovação da proposta, exatamente como ocorreu.
O Ministro Luis Felipe Salomão destacou que o voto dissidente de apenas um credor, mesmo que representando a maioria dos votos presentes na assembleia, não pode ser tomado como representativo da vontade dos demais.
Nas palavras do Ministro: “Nessa linha de entendimento afirma-se que, também no caso em exame, inclusive visando evitar eventual abuso do direito de voto da minoria, justamente no momento de superação de crise, é necessário que se confira certa sensibilidade à verificação dos requisitos do cram down”.
O Ministro Marco Buzzi seguiu a mesma linha, ao destacar que, apesar de a Lei fazer referência a requisitos objetivos e aparentemente rígidos para a concessão do cram down, o juiz está apto a mitigar esses pressupostos para observar os princípios da preservação da empresa e da proibição do abuso de direito.
É certo que se trata de importante precedente para a área de insolvência, considerando as diversas complexidades oriundas das negociações feitas em processos de Recuperação Judicial, especialmente com credores que tem conhecimento do poder do seu voto para determinar, de forma isolada, sobre a continuidade da atividade empresária.
Nathália Albuquerque Lacorte Borelli. Advogada formada pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas – PUCCAMP. Pós-graduada em Gestão e Estratégia Empresarial na Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP. Pós-graduanda em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Membro da Comissão de Estudos em Falência e Recuperação Judicial da OAB/ Campinas. Membro do Centro de Mulheres na Reestruturação Empresarial – CMR – nathalia@ygadv.com.br