QUEBRA DE SIGILO DOS DADOS DE GEOLOCALIZAÇÃO PARA PRODUÇÃO DE PROVAS x DIREITO À PRIVACIDADE

A produção de prova de horas extras é um tema que causa muita insegurança às empresas e empresários já que, por inúmeras vezes, precisam se apegar aos registros de pontos ou a testemunhas que sequer acompanharam a jornada de trabalho do colaborador durante o contrato.

Assim, à luz do artigo 74, parágrafo 2º da CLT: “para os estabelecimentos com mais de 20 (vinte) trabalhadores será obrigatória a anotação da hora de entrada e de saída, em registro manual, mecânico ou eletrônico, conforme instruções expedidas pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, permitida a pré-assinalação do período de repouso”[1]

Por serem responsáveis pelo ônus da prova, as empresas acabam tendo os cartões de ponto contestados pelo ex-funcionário dentro da reclamação trabalhista proposta e, por isso, precisam encontrar outros meios de provar que aquele ex-empregado não faz jus às horas extras requeridas.

Recentemente, as instituições bancárias passaram a solicitar – nas ações de ex-colaboradores que pleiteiam o pagamento de jornada extraordinária – a quebra de sigilo dos dados geolocalização dos ex funcionários.

O procedimento consiste em solicitar à Justiça do Trabalho que autorize o envio de ofícios às empresas responsáveis pela tecnologia, para que entreguem os dados solicitados, a fim de confirmar se o ex-colaborador estava na empresa nos horários por ele alegados na reclamação trabalhista.

Embora seja garantido pela Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso LV, o direito ao contraditório e ampla defesa dentro de um processo, a Jurisprudência ainda se mostra instável quanto à esse novo meio de prova.

A argumentação utilizada pelos Tribunais ao indeferir a produção de prova, por meio de quebra de sigilo das informações de geolocalização, é de que haveria clara violação à privacidade, bem como a necessidade de utilizar meios de prova mais adequados para tal comprovação, tais como filmagens, dados internos dos sistemas e imagens.

Contudo, em favor do pedido, temos parte da Jurisprudência alegando que não há violação à privacidade, tampouco às disposições da Lei Geral de Proteção de Dados, já que seriam dados limitados a necessidade da produção de provas.

Além disso, a Lei Geral de Proteção de dados prevê a possibilidade de tratamento de dados em seu artigo 7º, inciso VI,  para o exercício regular de direitos em processo judicial, administrativo ou arbitral, esse último nos termos da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996 (Lei de Arbitragem).[2]

Nosso entendimento é de que, se faz necessário uma análise criteriosa dos direitos envolvidos em uma demanda judicial trabalhista, a fim de que não haja prejuízos de ordem moral ou financeira para nenhuma das partes.

 Havendo o conflito entre direitos fundamentais – privacidade e direito ao contráditório e ampla defesa – caberá ao julgador coordenar e equilibrar, através do princípio da proporcionalidade, os direitos em conflito, evitando a prevalência de um em detrimento do outro.

Daniela de Oliveira Tiera – Advogada Trabalhista no escritório Yuri Gallinari Advogados. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUCCAMP). Especialista em programas de Compliance de Proteção de Dados e Privacidade.

[1] Artigo 74, parágrafo 2º – Consolidação das Leis do Trabalho

[2] Artigo 7, inciso VI da Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709/2018)