A FLEXIBILIDADE DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO NO NOVO CPC: O DEBATE SOBRE EFICIÊNCIA E AUTOCOMPOSIÇÃO NO STJ

A conciliação, como meio de resolução de conflitos, sempre foi um princípio presente no ordenamento jurídico brasileiro, mas com o novo Código de Processo Civil de 2015, esse instituto passou a ser ainda mais valorizado.

O art. 334[1] do CPC, estabelece que a audiência de conciliação ou mediação deve ser designada logo após a petição inicial, salvo em casos específicos de desinteresse manifestado por ambas as partes. A finalidade é incentivar a autocomposição e, consequentemente, a redução da sobrecarga do Judiciário, promovendo uma resolução mais célere e eficiente dos litígios.

Entretanto, recentemente, o C. Superior Tribunal de Justiça iniciou o julgamento do REsp 2.071.340, em que questionam se o juiz pode dispensar a audiência prévia de conciliação quando apenas uma das partes manifesta desinteresse. A questão envolve a interpretação do parágrafo 4º do artigo 334 do CPC, que determina que a audiência de conciliação será dispensada apenas quando ambas as partes se manifestarem expressamente contra a composição consensual.

A relatora do caso – e única a votar até o presente momento –, Ministra Isabel Gallotti, defendeu a possibilidade de dispensa da audiência quando, de acordo com as circunstâncias do processo, for improvável o consenso entre as partes ou se a audiência prejudicar a duração razoável do processo.

A ministra propôs, ainda, que o C. STJ declare a inconstitucionalidade parcial do parágrafo 4º do artigo 334 do CPC, permitindo que o juiz tenha a autonomia para decidir, em determinados casos, pela dispensa da audiência de conciliação, desde que essa decisão seja devidamente fundamentada. A relatora ressaltou que a impossibilidade de conciliação não pode ser tratada de forma rígida, uma vez que o juiz da causa é o melhor conhecedor das especificidades do processo.

Neste sentido, importante destacar trecho de seu voto:

Se as circunstâncias indicarem ser improvável o consenso ou que o ato colocaria em risco a duração razoável do processo, a audiência de conciliação do artigo 334 do CPC pode ser dispensada, com a devida fundamentação;

Diante de inexistência de prejuízo, a ausência de designação de audiência de conciliação não gera nulidade, podendo o tribunal de segundo grau, se for caso, determinar sua realização no juízo de origem ou no próprio tribunal, conforme hipótese do artigo 938, parágrafo 1º do CPC.

Essa proposta de revisão do Código de Processo Civil, revela a tensão entre a necessidade de celeridade e eficiência processual e o direito das partes à participação em um processo de conciliação, que é, por definição, voluntário. A análise do desinteresse de uma das partes pode, em certos casos, ser uma ferramenta para evitar atrasos desnecessários e permitir uma solução mais rápida para o conflito, evitando agendamentos de audiências infrutíferas, e tornando o processo mais célere.

Em suma, o julgamento em curso no Superior Tribunal de Justiça gera um debate fundamental sobre a flexibilidade no processo civil, e o equilíbrio entre a busca pela eficiência e a preservação dos direitos das partes. A proposta da Ministra Isabel Gallotti, visa adaptar o processo às especificidades de cada caso, buscando garantir uma tramitação mais célere e adequada às circunstâncias de cada litígio.

Ana Julia Morgado, formada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, advogada das áreas cível, empresarial e de relações de consumo no escritório Yuri Gallinari Advogados, e-mail: ajulia@ygadv.com.br


[1] Art. 334. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência.

§ 1º O conciliador ou mediador, onde houver, atuará necessariamente na audiência de conciliação ou de mediação, observando o disposto neste Código, bem como as disposições da lei de organização judiciária.

§ 2º Poderá haver mais de uma sessão destinada à conciliação e à mediação, não podendo exceder a 2 (dois) meses da data de realização da primeira sessão, desde que necessárias à composição das partes.

§ 3º A intimação do autor para a audiência será feita na pessoa de seu advogado.

§ 4º A audiência não será realizada:

I – se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual;

II – quando não se admitir a autocomposição.