EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE POR TERCEIRO INTERESSADO EM EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL

Sabe-se que, quando medidas constritivas são aplicadas sobre bens de terceiros indevidamente em Ações de Execução, o meio de defesa mais comum é a interposição de Embargos de Terceiro, conforme prevê o art. 674 e seguintes, do Código de Processo Civil:

Art. 674. Quem, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo, poderá requerer seu desfazimento ou sua inibição por meio de embargos de terceiro.

§ 1º Os embargos podem ser de terceiro proprietário, inclusive fiduciário, ou possuidor.

§ 2º Considera-se terceiro, para ajuizamento dos embargos:

I – o cônjuge ou companheiro, quando defende a posse de bens próprios ou de sua meação, ressalvado o disposto no art. 843;

II – o adquirente de bens cuja constrição decorreu de decisão que declara a ineficácia da alienação realizada em fraude à execução;

III – quem sofre constrição judicial de seus bens por força de desconsideração da personalidade jurídica, de cujo incidente não fez parte;

IV – o credor com garantia real para obstar expropriação judicial do objeto de direito real de garantia, caso não tenha sido intimado, nos termos legais dos atos expropriatórios respectivos.

No entanto, há outros meios de defesa que podem ser apresentados pelas partes, como  a Exceção de Pré-Executividade – instrumento jurídico de defesa utilizado especificamente no que tange a alegações de matéria de ordem pública, sem necessidade de garantia do juízo, tampouco de dilação probatória, que, muito embora não tenha previsão legal específica, foi criado pela doutrina e pela jurisprudência, em observância aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, previstos no art. 5°, LIV, LV, XXXV da Constituição Federal.

A esse respeito, cumpre trazer o conceito da Exceção de Pré-Executividade delimitado por Cassio Scarpinella Bueno[1]:

Exceção de pré-executividade – meio de defesa do executado que viabiliza ao magistrado, independentemente da “impugnação” ou dos “embargos à execução”, a apreciação de questões de ordem pública e/ou que não dependam de dilação probatória.

Dito isso, em recente decisão proferida pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que deu provimento ao REsp n° 2.095.052, foi-se entendido que terceiros interessados também têm legitimidade para propor Exceção de Pré-Executividade, contando a Ementa com o seguinte teor:

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EXECUÇÃO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. LEGITIMIDADE. INTERESSE JURÍDICO. TERCEIRO INTERESSADO. CONSTRIÇÃO DE BENS. EMBARGOS DE TERCEIRO. 1. Ação de execução da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 18/04/2023 e concluso ao gabinete em 16/10/2023. 2. O propósito recursal é decidir se o terceiro interessado possui legitimidade para opor exceção de pré-executividade. 3. A exceção de pré-executividade é cabível quando atendidos simultaneamente dois requisitos, um de ordem material e outro de ordem formal, quais sejam: a) a matéria invocada deve ser suscetível de conhecimento de ofício pelo juiz; e b) desnecessidade de dilação probatória. 4. Por se tratar de instituto que trata de matéria passível de ser reconhecida de ofício pelo julgador, não se vislumbra impedimento para que terceiros interessados oponham exceção de pré-executividade. 5. Se a lei permite que os terceiros listados no art. 674 do CPC possam opor de embargos de terceiro, é razoável que também tenham legitimidade para opor exceção de pré-executividade. 6. Recurso especial conhecido e provido.

No caso mencionado de origem, a empresa que interpôs o Recurso Especial era terceira interessada em processo de execução, uma vez que o Exequente requereu a penhora de bens imóveis pertencentes a ela, que não possuía relação com a demanda.

Passados mais de 5 (cinco) anos sem qualquer movimentação no processo, a empresa apresentou Exceção de Pré-Executividade alegando prescrição intercorrente por falta de manifestação do Exequente, mas foi rejeitada pelo D. Juízo singular sob o entendimento de que terceiros interessados não teriam legitimidade para propor exceção de pré-executividade, e que a defesa de seus interesses seria por meio de embargos de terceiro – entendimento que posteriormente veio a ser reformado pelo C. STJ.

Diante da peculiaridade do tema, cabe destacar trechos do voto da Ilma. Ministra Nancy Andrighi:

11. Embora autores como Araken de Assis defendam que a legitimidade “não toca a qualquer pessoa (…) sob o vago pretexto de que todos hão de colaborar com a administração da justiça”, é uníssono o entendimento doutrinário quanto à possibilidade de que a exceção de pré-executividade pode ser oposta pelos que ostentem interesse jurídico na execução. 12. Assim, se a lei permite que os terceiros listados no art. 674 do CPC possam opor de embargos de terceiro, é razoável que também tenham legitimidade para opor a exceção de pré-executividade. 13. Tal conclusão torna-se notória quando a matéria a qual o terceiro interessado pretenda alegar – por não ter sido apreciada de ofício pelo julgador- já não possa mais ser suscitada em embargos de terceiros porque decorrido o prazo para tanto. Nessas situações, não há razão para limitar a defesa do terceiro interessado sendo que a exceção de pré-executividade serve precisamente a este fim. 14. Em vista disso, ostenta interesse jurídico e legitimidade para opor exceção de pré-executividade aquele que sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua, nos termos do art. 674 do CPC.

Assim, é possível concluir que a decisão do Superior Tribunal de Justiça de reconhecer a legitimidade de terceiros interessados para propor Exceção de Pré-Executividade, amplia significativamente os mecanismos de defesa disponíveis para aqueles que não são partes diretamente envolvidas na execução, mas que sofrem constrições indevidas sobre seus bens. Essa possibilidade reforça o princípio do devido processo legal ao garantir que terceiros possam defender seus direitos de forma mais célere e eficaz, sem a necessidade de interpor e enfrentar a extensão dos embargos de terceiro.

Ana Julia Morgado, Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, advogada do escritório Yuri Gallinari Advogados, e-mail: ajulia@ygadv.com.br


[1] (Bueno, Cassio Scarpinella Manual de direito processual civil : volume único / Cassio Scarpinella Bueno. – 5. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2019.)