INSTITUIÇÃO FINANCEIRA É CONDENADA A INDENIZAR PESSOA JURÍDICA POR FRAUDE OCORRIDA EM CONTA BANCÁRIA

Pessoas jurídicas possuem direito à indenização advinda de uma Instituição Financeira após sofrer invasão em sua conta bancária, equiparando-se ao status de consumidor que uma pessoa física detém?

Para abordar essa temática, impõe-se algumas reflexões. Primeiramente, o art. 2º do Código de Defesa do Consumidor delimita que “consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”, conferindo à pessoa jurídica a qualidade de consumidora ao adquirir um bem ou serviço para sua utilização final.

Em segundo plano, a Súmula 297 do C. Superior Tribunal de Justiça (STJ) estipula que “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”, o que estabelece a possibilidade de configuração de relações de consumo entre pessoas jurídicas e instituições financeiras.

É notório o aumento das fraudes perpetradas em contas bancárias, tanto de pessoas físicas quanto de pessoas jurídicas, por intermédio de terceiros que conseguem acesso a informações confidenciais e privilegiadas, que deveriam ser mantidas sob sigilo pelas instituições financeiras, e efetuam transações em detrimento dos consumidores.

Neste sentido, em recente caso patrocinado por nosso escritório, a Autora – uma plataforma de exercícios on-line – obteve êxito em uma ação através de Recurso de Apelação contra a Ré – uma instituição financeira –, sendo-lhe deferida a indenização por danos materiais e morais decorrentes de uma fraude cometida por terceiros que invadiram sua conta e transferiram os valores nela contidos para a conta dos transgressores, após a instituição financeira bloquear o acesso da Autora às suas próprias contas.

Inclusive, o E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo tem se posicionado em consonância com o caso patrocinado por nosso escritório, como atestado pelos julgados abaixo proferidos nos autos do Recurso de Apelação n° 1006962-63.2018.8.26.0625[1], bem como do Agravo de Instrumento n° 2235578-40.2022.8.26.0000[2].

Ante a todo o exposto, se fora constatado que uma empresa sofreu um golpe em contas bancárias, saiba que a posição do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo é quase unânime no sentido de que as instituições financeiras, por se configurarem como fornecedoras das relações de consumo, são obrigadas a responderem pelas fraudes.

Assim, se após tentativas administrativas de resolver o infortúnio diretamente com a instituição financeira, esta se recusar a dirimir a questão, procure um profissional especializado e de confiança, que possa analisar a viabilidade e a possibilidade de ingressar com uma ação judicial diante do caso concreto.

Ana Julia Morgado, advogada formada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, e-mail de contato ajulia@ygadv.com.br


[1] AÇÃO INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – Sentença de procedência – Recurso do banco requerido – DEFEITO NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO BANCÁRIO – Transferências eletrônicas indevidas realizadas a partir da conta bancária da empresa autora via internet banking – CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – Aplicabilidade no caso concreto, em virtude da vulnerabilidade da pessoa jurídica – Responsabilidade objetiva da instituição financeira não elidida pela ação da vítima –– Hipótese em que o banco requerido não comprovou que as transações eletrônicas foram realizadas mediante senha pessoal e token – Ônus que lhe incumbia, tendo em vista a falibilidade do sistema eletrônico – Fortuito interno que atrai a responsabilidade objetiva da instituição financeira por danos decorrentes de fraudes praticadas por terceiros – Aplicação da Súmula 479 do STJ – Hipótese em que cabia ao agente financeiro demonstrar a regularidade das movimentações – Ocorrência das operações financeiras, sobre valores e sobre os juros cobrados na conta e decorrentes do saldo negativo ocorrido após a fraude sendo o banco réu responsável pela guarda de numerário e pela segurança das operações bancárias, evidente que cabia a ele atentar-se para a ocorrência das transações anômalas na conta da autora , alertando a cliente/consumidora para eventuais fraudes, obstaculizando que o dano ocorra ou, até mesmo, que atinja patamares expressivos- Má prestação de serviços que evidencia a responsabilidade da instituição financeira pelos danos causados – Inocorrência de culpa de terceiros ou de culpa exclusiva da vítima – O quadro probatório não aponta a presença de excludentes – Caracterizados o ato ilícito e os danos decorrentes e não elidida a responsabilidade objetiva do réu, fica configurado o dever de indenizar – DANOS MATERIAIS- Possibilidade – Valor que deve corresponder à integralidade dos prejuízos experimentados pela autora – DANO MORAL – CARACTERIZAÇÃO – Requerente que teve sua conta bloqueada para impedir que novos saques fossem realizados, o que por óbvio veio a prejudicar suas negociações com fornecedores e clientes, mormente, em se tratando de pessoa jurídica que tem suas atividades predominantemente vinculadas às atividades bancárias, não se podendo considerar que referidos transtornos decorrem do diaadia ou que perfazem meros aborrecimentos – O dano moral está consubstanciado pelos enormes transtornos sofridos pela autora, relacionados à cobrança indevida de valores e desfalque em sua conta corrente -Com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, limitado pelo valor indicado à inicial, o magistrado fixou a indenização por danos morais em R$ 5.000,00 – QUANTUM INDENIZATÓRIO – Pleito de redução – Impossibilidade – Valor fixado em sentença, de R$ 5.000,00 não comportando redução – Sentença mantida – RATIFICAÇÃO DO JULGADO – Hipótese em que a sentença avaliou corretamente os elementos fáticos e jurídicos apresentados pelas partes, dando à causa o justo deslinde necessário – Artigo 252, do Regimento Interno do TJSP – Aplicabilidade – Sentença mantida – RECURSO NÃO PROVIDO.

(TJ-SP – AC: 10069626320188260625 SP 1006962-63.2018.8.26.0625, Relator: Spencer Almeida Ferreira, Data de Julgamento: 15/06/2020, 38ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 15/06/2020)

[2] AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DECLARATÓRIA – PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – PESSOA JURÍDICA – CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA – O que qualifica uma pessoa jurídica como consumidora é a aquisição ou utilização de produto ou serviço em benefício próprio, necessário à sua atividade empresarial, sem interesse de repassá-lo a terceiros – Empresa agravante, atuante no ramo de contabilidade, consultoria e assessoria nas áreas fiscais, trabalhistas e de gestão empresarial, utilizando a internet e linhas telefônicas fornecidas pela parte contrária para o exercício de sua atividade empresarial, sem interesse de repassá-lo a terceiros – Relação de consumo caracterizada – Configurada a hipossuficiência técnica e vulnerabilidade da empresa agravante perante a agravada – Inversão da prova com base no artigo 6º, VIII, do CDC – Decisão reformada – Agravo provido.

(TJ-SP – AI: 22355784020228260000 SP 2235578-40.2022.8.26.0000, Relator: Salles Vieira, Data de Julgamento: 25/11/2022, 24ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/11/2022)