PENHORA DE IMÓVEL ALIENADO FIDUCIARIAMENTE PARA PAGAMENTO DE DÍVIDA CONDOMINAL

 A alienação fiduciária está disposta nos artigos 1361 a 1368-B do Código Civil, bem como no artigo 22 da Lei nº 9.514/97, e consiste em um negócio jurídico pelo qual o fiduciante, no caso o devedor, proprietário de um imóvel, aliena-o ao fiduciário, o credor da relação, a título de uma garantia de dívida. A finalidade deste tipo de alienação é garantir o cumprimento de uma obrigação.

Tido o supracitado, uma audiência pública foi efetuada pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ) para discutir penhora de imóvel alienado fiduciariamente para pagamento de dívida condominial. Foram reunidos especialistas no assunto para debater a questão em pauta.

O Ministro Antonio Carlos Ferreira informou que a Terceira Turma possui o entendimento de que é impossível penhorar o imóvel nessas situações, contudo, a Quarta Turma permitiu essa possibilidade ao analisar a natureza propter rem da dívida condominial.

Durante o debate, houve o voto do Ministro Raul Araújo no sentido de que, em razão da natureza propter rem da dívida, é necessária a citação da Instituição Financeira. Para o Ministro, os direitos de terceiros que não são parte do contrato de financiamento não podem ter sobrepostos sobre si as normas que regulam a alienação fiduciária.[1]

O ministro supracitado afirmou em seu voto que seria uma situação confortável para o devedor das cotas condominiais, se o imóvel tiver abrangido pela “impenhorabilidade” devido à alienação fiduciária, bem como para a instituição financeira, no caso em que o devedor fiduciante estivesse com a quitação do financiamento em dia, mesmo que esteja devendo as taxas condominiais.[2]

O professor Rubens Carmo Elias Filho afirmou que é necessário encontrar um modelo que traga equilíbrio entre o crédito fiduciário e a despesa condominial. Ele afirmou que a penhora dos direitos do devedor fiduciante não é efetiva, o que prejudica as execuções das cotas condominiais, resultando na não liquidez das execuções.[3]

Ainda na esteira do pensamento de Rubens Carmo, o professor avalia que a penhora do imóvel para pagamento das dívidas condominiais deve ser possibilitada em determinadas ocasiões, para haver a preservação do crédito da alienação, bem como do crédito condominial.

Por outro lado, Anselmo Moreira Gonzales, representante da Federação Brasileira de Bancos afirmou que “O entendimento atual do STJ dá segurança ao agente de crédito. Hoje, quando um banco concede um crédito imobiliário, ele tem a tranquilidade de que o artigo 27, parágrafo 8, da Lei da Alienação Fiduciária e o artigo 1.368-B do Código Civil são expressos em dizer que é o patrimônio do devedor fiduciante que responde pelas dívidas do condomínio”.[4] Portanto, Anselmo alegou que não houve mudanças socioeconômicas no Brasil que justifiquem a mudança de tal jurisprudência.

Para Alaim Giovani Fortes Stefanello, representante da Caixa Econômica Federal, a solução para este caso é adotar a regra disposta no artigo 22, §6, da Lei 9.514/1997, citada anteriormente, na qual o condômino que não honrar com as suas obrigações, terá o financiamento encerrado antecipadamente.[5]

À abertura do terceiro painel, Thiago Dueire Lins Miranda, advogado, representou que o Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis e dos Edifícios em Condomínios Residenciais e Comerciais do Estado de Pernambuco (Secovi-PE) entende que o imóvel objeto da alienação deve ser levado à hasta pública. Nesse sentido, o advogado defendeu a jurisprudência do STJ. Esta que se posiciona no sentido do devedor fiduciante responder pelas obrigações condominiais. O advogado Melhim Namem Chalhub, representando a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), afirmou que o posicionamento desta é igual ao da SECOVI-PE.[6]

No quarto painel, incentivando a preservação da substância do organismo condominial, o advogado Marcus Vinicius Kikunaga, em nome da Academia Nacional de Direito Notarial e Registral (AD Notare), defendeu a penhora do imóvel alienado fiduciariamente, uma vez que, ela faz com que haja uma solidariedade de obrigações entre o credor e o devedor.[7]

Ainda no painel quatro, a advogada Regina Céli Silveira Martins, representando a Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), argumentou a favor impenhorabilidade do imóvel alienado fiduciariamente, isso pois, tal cenário desencadeia uma forte melhoria no déficit habitacional da sociedade brasileira. Ainda, Martins pontuou que a penhora do imóvel, para que haja a alienação fiduciária, só pode ser viabilizada caso o credor autorize.[8]

Iniciando o quinto painel, o advogado Roberto Garcia Merçon, representando o Sindicato Patronal de Condomínios Residenciais, Comerciais e Mistos, e de Empresas Administradoras de Condomínios no Estado do Espírito Santo, exceto região sul (SIPCES), argumentou a favor da penhora do imóvel na fase executória. Indo de encontro com esse posicionamento, o Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais do Estado de São Paulo (Secovi-SP), representado pelo advogado José Carlos Baptista Puoli, expôs que a penhora só pode ser executada em relação aos direitos creditícios que decorreram da alienação fiduciária. Isso porque, segundo o advogado: “a dívida e a responsabilidade têm um só destinatário: aquele que usufruiu dos serviços e das utilidades possibilitadas pela vida em condomínio é quem é o efetivo devedor.”[9]

Diante das variadas argumentações apresentadas, a questão da penhora de imóvel alienado fiduciariamente para pagamento de dívidas condominiais permanece controversa e complexa. As discussões na audiência pública promovida pelo C. STJ evidenciam a necessidade de equilibrar os interesses do crédito fiduciário e das despesas condominiais, respeitando tanto os direitos dos credores quanto a viabilidade econômica dos condomínios.

LUIZ ANTONIO TAVARES SCAVARDA, estagiário do 4º semestre da PUC-SP.


[1]Supremo Tribunal de Justiça . Disponível em:  https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2023/14092023-Quarta-Turma-admite-penhora-de-imovel-financiado-com-alienacao-fiduciaria-na-execucao-de-cotas-condominiais.aspx

[2]  Idem. Ibidem

[3]Supremo Tribunal de Justiça . Disponível em:  https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2024/03062024-Audiencia-discute-penhora-de-imovel-alienado-fiduciariamente-para-pagamento-de-divida-condominial.aspx

[4] Supremo Tribunal de Justiça . Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2024/03062024-Audiencia-discute-penhora-de-imovel-alienado-fiduciariamente-para-pagamento-de-divida-condominial.aspx.

[5] Idem. Ibidem

[6] Idem. Ibidem

[7] Idem. Ibidem

[8] Idem. Ibidem.

[9] Supremo Tribunal Federal. Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2024/03062024-Audiencia-discute-penhora-de-imovel-alienado-fiduciariamente-para-pagamento-de-divida-condominial.aspx