O processo de Recuperação Judicial das “Lojas Americanas’ se iniciou com pedido de Tutela de Urgência Cautelar, em caráter antecedente.
O pleito de tutela, adveio no sentido de resguardar a companhia para que pudesse ser elaborado o pedido de Recuperação Judicial, de modo a reparar o prejuízo noticiado através de fato relevante em 11 de janeiro de 2023 e com divulgação massiva pelos meios de comunicação.
O fato relevante em questão, foi a constatação por parte da sociedade empresária, de inconsistências contábeis em montante aproximado de R$ 20 bilhões. No entanto, importante destacar que as inconsistências descobertas, atingem diretamente os resultados de exercícios anteriores, modificando assim, toda a dinâmica financeira da sociedade, em especial, por tratar-se de sociedade anônima com capital aberto.
Logo, assim que noticiada esta discrepância, as instituições financeiras em ato reflexo iniciaram os procedimentos para requerer o vencimento antecipado da dívida, o que por óbvio resultaria na insolvência da companhia, inviabilizando assim o exercício da atividade empresarial.
Diante do cenário supra narrado, a medida cautelar foi acolhida em 13 de janeiro pela 4ª Vara Empresarial da comarca do Rio de Janeiro/RJ, visando resguardar o resultado útil do processo de Recuperação Judicial e determinando dentre outras medidas, o sobrestamento dos efeitos de toda e qualquer cláusula que imponha o vencimento antecipado das dívidas e concedendo prazo de 30 dias para apresentação do pedido de Recuperação Judicial.
Dentre os primeiros credores a se manifestar pelo vencimento antecipado das obrigações financeiras, o Banco BTG Pactual buscou a constrição de aproximadamente R$ 1.2 bilhão de reais em ativos, o que posteriormente foi concedido pelo Superior Tribunal de Justiça em 25 de janeiro de 2023.
Entre os maiores credores estão o Banco Bradesco com R$ 4.7bi, o Banco Santander com R$ 3.7bi a receber, bem como, o Banco Itaú e o Banco Safra com R$ 3.4 e R$ 2.5bi a receber, respectivamente. Há ainda outros cinco bancos que somados com os acima listados, possuem crédito de R$ 18.8 bilhões.
Em ato contínuo, foi apresentado o pedido de Recuperação Judicial com passivo declarado de aproximadamente R$ 43bi, sendo listados, também de forma aproximada, 16.300 credores.
Já em 19 de janeiro de 2023, foi deferido o processamento do Pedido de Recuperação Judicial do Grupo Americanas, confirmando a liminar concedida cautelarmente e assim, suspendendo todas as ações e execuções existentes contra as sociedades empresárias do grupo, bem como a exigibilidade dos créditos concursais, determinou-se também o sobrestamento de toda e qualquer cláusula que imponha vencimento antecipado das dívidas das Requerentes, o que como vimos, posteriormente foi modificado pelo Superior Tribunal de Justiça, uma vez que permitiu-se que o Banco BTG Pactual realizasse a constrição de R$ 1.2bi.
Ainda em 26 de janeiro de 2023, na Ação de Produção Antecipada de Provas com Pedido de Tutela Antecipada de nº 1000147-05.2023.8.26.0260, ajuizado por Banco Bradesco S.A em face de Americanas S.A, foi proferida decisão determinando busca e apreensão de todas as caixas de e-mail institucionais dos diretores da Americanas, dos atuais e dos que ocuparam tais cargos pelos últimos dez anos, membros do Conselho de Administração e do Comitê de Auditoria da Americanas, dos atuais e dos que ocuparam tais cargos nos últimos dez anos, bem como dos funcionários da área de contabilidade e de finanças da companhia, nomeando ao final a Ernst & Young para conduzir a produção das provas periciais contábeis e verificar se houve fraude contábil.
Certo é que o processo de recuperação judicial ainda terá inúmeros desdobramentos. Contudo, é possível concluir que o processo de Recuperação Judicial do “Grupo Americanas” não supera a conceituação de uma Recuperação Judicial normal, com discussões padrões, exceção do destaque midiático conferido em função da familiaridade que o consumidor possui com a loja, fato inclusive alegado no pleito de Recuperação Judicial, além da dimensão dos valores discutidos e eventuais fraudes que serão apuradas ao longo demanda ou pela via judicial própria – que aos olhos do cidadão médio são inimagináveis.
Fernando Marques Villaça – Bacharel em Direito pela Universidade Mackenzie. Advogado da área cível no escritório Yuri Gallinari Advogados.