O Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica, é uma modalidade de intervenção de terceiros, que pode ser requerida em sede de manifestação exordial, ou incidentalmente ao processo, e que permite, no caso de acolhimento, desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade empresária, responsabilizando assim o sócio ou as demais empresas que compõem o grupo econômico.
Para se valer desta possibilidade, é necessário adotar uma das duas teorias previstas no nosso ordenamento jurídico, a teoria menor ou a teoria maior.
O Código de Defesa do Consumidor, estabelece em seu artigo 28 a possibilidade de desconsiderar a personalidade jurídica de sociedade empresária, se valendo da teoria menor da desconsideração.
Neste sentido, cabe destacar que o ordenamento jurídica pátrio adotou, como regra, a teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica, presente no artigo 50 do Código Civil.
No entanto, a legislação consumerista, por entender ser mais benéfica ao consumidor, adota a teoria menor, que por sua vez possui requisitos mais simples de serem comprovados, não exigindo por exemplo a prova da fraude, do abuso de direito ou de confusão patrimonial, requisitos estes presentes no artigo 50 do Código Civil.
Na teoria menor, basta por exemplo comprovar que a personalidade jurídica é, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores, como dispõe o artigo 28, §5º do Código de Defesa do Consumidor.
No entanto, em decisão recente, o C. Superior Tribunal de Justiça, por meio do julgamento do REsp 1.864.620/SP, decidiu que, ainda que se fale na teoria menor como um meio mais simples e benéfico ao consumidor para desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade empresária Executada, esta dita facilidade não pode suprimir o devido processo legal, em especial quando se visa atingir as demais empresas do grupo econômico.
Isto pois, restou decidido no REsp 1.864.620/SP que, para que uma empresa, pertencente ao mesmo grupo econômico da Executada, sofra constrição patrimonial, é necessário que seja previamente instaurado em face desta o Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica.
Deste modo, temos que não é suficiente mero redirecionamento do cumprimento de sentença, contra empresa que não integrou a lide na fase de conhecimento tão somente sob a alegação de que compõe o mesmo grupo econômico da Executada.
A decisão se alinha com a própria redação do artigo 136 do Código de Processo Civil, que nos ensina que: “Concluída a instrução, se necessária, o incidente será resolvido por decisão interlocutória.”
Ora, se o próprio incidente pode necessitar de instrução probatória, nos parece evidente que o mero redirecionamento, ainda que em fase de cumprimento de sentença para empresa que não participou do processo de conhecimento não deve ser admitido, sob pena de ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa.
Em complemento, a lição da doutrina[1]: “O caput do art. 134 do CPC/2015 torna clara a amplitude de cabimento do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, prevendo-o tanto para a fase de conhecimento, quanto para a fase de cumprimento de sentença, bem como para o processo de execução fundada em título executivo extrajudicial:(…) Assim, pode-se concluir que, a partir da vigência do Código de Processo Civil de 2015, toda a desconsideração da personalidade jurídica estará condicionada à prévia oportunidade de exercício do contraditório por meio do incidente de desconsideração da personalidade jurídica.”
Logo, o que verificamos em conclusão, é que a teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica, em que pese ser medida mais simples e benéfica ao consumidor, para atingir o patrimônio do executado, deve se sujeitar as regras do Código de Processo Civil, em especial, no que diz respeito ao contraditório e à ampla defesa, sendo mantidos os requisitos que permitem sua aplicação, desde que observado o devido processo legal.
Fernando Marques Villaça – Bacharel em Direito pela Universidade Mackenzie (Campinas/SP), Advogado na área Cível do escritório Yuri Gallinari Advogados. e-mail: fernando@ygadv.com.br
[1] (BRUSHI, Gilberto Gomes; NOLASCO, Rita Dias; AMADEO, Rodolfo da Costa Manso Real. Fraudes patrimoniais e a Desconsideração da Personalidade Jurídica no Código de Processo Civil de 2015. 1. ed. em e-book baseada na 1. edição impressa, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2016, ISBN 978-85-203-6066-8. Disponível em: <https://proview.thomsonreuters.com>. Acesso em: 23/9/2016).